Agência Panafricana de Notícias

Tribunal Constitucional chamado a fiscalizar acordo de defesa entre EUA e Cabo Verde

Praia, Cabo Verde (PANA) - O provedor de Justiça de Cabo Verde vai, em resposta a uma petição de um grupo de 88 cidadãos, suscitar ao Tribunal Constitucional (TC) a fiscalização abstrata e sucessiva do acordo de defesa e segurança entre Cabo Verde e os Estados Unidos, assinado a 25 de setembro de 2017, apurou a PANA, na cidade da Praia.

Trata-se de um segundo pedido feito ao TC para se pronunciar sobre a constitucionalidade de determinadas normas do Acordo de Estatuto de Forças (Status Of Forces Agreement, SOFA), que estabelece um quadro de parceria e cooperação aplicável ao pessoal e aos contratantes americanos que estejam temporariamente, em Cabo Verde, no âmbito de visitas de navios, formação, exercício, atividades humanas e outras.

O primeiro pedido foi feito, a 22 de outubro, do ano passado, pelo Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV), a maior forca política da oposição cabo-verdiana, pouco depois de o Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca, ter ratificado o acordo, em setembro de 2018.

A iniciativa atual passou resultou de uma petição pública, na qual os subscritores solicitam ao provedor de Justiça de Cabo Verde, António Espírito Santo Silva, para requerer ao TC a fiscalização abstrata sucessiva da constitucionalidade do referido
Acordo.

Segundo fonte da Provedoria da Justiça, a intervenção de António Espírito Santo Silva vai realizar-se, depois de analisadas as questões e ouvidos especialistas.

De acordo com o semanário cabo-verdiano “A Nação”, o provedor de Justiça confirmou que, no dia 19 de novembro de 2018, a petição deu entrada na instituição que dirige, e na qual os signatários colocam um conjunto de questões relacionadas com a garantia do exercício de direitos assegurados aos cidadãos nacionais, às associações cívicas e entidades diversas.

“Entendem que da forma como o Acordo SOFA se encontra redigido, os interesses de Cabo Verde, particularmente no domínio da justiça, não se encontram devidamente salvaguardados”, escreve o semanário.

Pronunciando-se sobre o Acordo SOFA, depois de o ter ratificado, Jorge Carlos Fonseca explicou que, enquanto Presidente da República, não vislumbrou qualquer matéria que lhe tivesse suscitado “fundadas dúvidas sobre a sua constitucionalidade”.

“Mas devo realçar que uma coisa é o reconhecimento de que uma dada solução possa ser geradora de polémica e atrair múltiplas vozes dissonantes, coisa completamente diversa é a probabilidade de ela conflituar com normas constitucionais da República de Cabo Verde”, precisou.

Na ocasião, o Governo e o partido que o suporta no Parlamento (MpD) congratularam-se com a decisão do chefe de Estado, dizendo que a ratificação do Acordo SOFA “trará ganhos a nível da economia e da defesa e segurança, pelo que não se deve estar “permanentemente a colocar entraves no desenvolvimento do país.”

Em declarações à imprensa, depois de ter entregue ao TC o pedido de fiscalização sucessiva do Acordo SOFA, a presidente do PAICV, Janira Hopffer Almada, disse que a sua bancada parlamentar estava a cumprir aquilo que havia prometido aos Cabo-verdianos, ou seja, caso o Presidente da República ratificasse o referido acordo, iria solicitar a fiscalização sucessiva de algumas normas constantes do documento.

Segundo a presidente do PAICV, o seu partido “sempre teve dúvidas” em relação a algumas normas do SOFA que, segundo ela, “poderiam pôr em causa a Constituição da República”.

“Entendemos que de nenhuma forma pode ser equacionada a possibilidade da instalação de uma eventual base militar em Cabo Verde, porque a Constituição [da República] não permite”, indicou, acrescentando que “deve ser preservado” o direito à dignidade e à igualdade dos cidadãos.

A líder do principal partido da oposição assinalou que o PAICV aguarda o pronunciamento do TC “com serenidade, mas com profunda responsabilidade e convicção na nossa posição”.

“Não somos contra o acordo [SOFA], mas entendemos que nenhum acordo pode ir contra a Constituição da República”, assegurou a líder do PAICV.

O acordo SOFA foi aprovado pelo Parlamento em junho de 2018, com os votos favoráveis do grupo parlamentar do maioritário MpD (Movimento para a Democracia) e de dois deputados da bancada do PAICV, tendo os restantes deputados desse partido optado pela abstenção, tal como dois outros da União Cabo-verdiana Independente e Democrática (UCID).

No sábado, o ministro cabo-verdiano dos Negócios Estrangeiros afirmou, em Lisboa (Portugal), que está "sereno e sem dúvidas", quanto à constitucionalidade do SOFA, a propósito do pedido de fiscalização por este grupo de cidadãos.

Luís Filipe Tavares sublinhou que o SOFA está em conformidade com a Constituição, embora tenha referido que o Governo "acatará uma decisão que vier a ser tomada".

O ministro não comentou os fundamentos do grupo de cidadãos e realçou "a importância do acordo com os Estados Unidos para a defesa e segurança de Cabo Verde", sublinhando a possibilidade de poderem ser feitos "outros programas de cooperação importantes para o país".

-0- PANA CS/IZ 05fev2019