Agência Panafricana de Notícias

Filho de antigo Presidente angolano vai a tribunal por desviar $ 500 milhões

Luanda, Angola (PANA) - A Procuradoria Geral da República (PGR) angolana anunciou, esta quinta-feira, ter introduzido em tribunal a sua acusação formal contra José Filomeno dos Santos (Zenu), filho do ex-Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, por ter alegadamente desviado 500 milhões de dólares americanos do Tesouro Nacional.

Em caso de aceitação da acusação pelo tribunal, Zenu deverá responder em juízo juntamente com três outros indivíduos implicados no mesmo processo, incluindo o antigo governador do Banco Nacional de Angola (BNA, central), Valter Filipe, revelou o vice-procurador geral da República, Mota Liz, em declarações à Rádio Nacional de Angola (RNA, estatal).

Mota Liz afirmou que existe uma “pressão muito grande” neste processo que resultou de uma transferência ilegal de 500 milhões de dólares americanos do BNA para uma conta do banco Crédit Suisse de Londres (Inglaterra), em 2017, quando Valter Filipe era governador do BNA e Zenu presidente do Conselho de Administração do Fundo Soberano de Angola (FSDEA).

O dinheiro foi transferido sob pretexto de garantia de um suposto financiamento de 30 biliões de dólares americanos, a favor do Estado angolano, numa operação que veio revelar-se uma burla, o que levou as autoridades britânicas a suspeitar e bloquear os fundos.

Os demais coacusados no processo são Jorge Gaudens Pontes Sebastião, amigo de infância e parceiro de negócios de Zenu, e António Samalia Bule Manuel, atual diretor do Departamento de Gestão de Reservas do banco central angolano, "desempenhando cada um papéis diferentes, mas complementares, para a consecução do objetivo final".

Segundo a peça acusatória produzida pelo procurador da República João Luís de Freitas Coelho, eles são acusados de "crimes graves" como associação criminosa, falsificação, tráfico de influências, burla, branqueamento de capitais e peculato.

O documento citado pelo portal Maka Angola, do ativista angolano Rafael Marques, dá a entender que os acusados se teriam conluiado, em 2017, para enganar o então Presidente da República (José Eduardo dos Santos) e o Estado angolano, a fim de se apropriarem de pelo menos 500 milhões de dólares americanos do Tesouro Nacional.

A história contada no texto aponta Zenu e o seu amigo Jorge Sebastião como os cérebros do plano que consistia em constituir um suposto Fundo de Investimento Estratégico e utilizar como instrumento de atuação a empresa Mais Financial Services, de Jorge Sebastião.

Além desta sociedade, interveio também a empresa britânica Resource Conversion, pertencente a Hugo Anthonie Folke Godfried Reinier Onderwater, de nacionalidade holandesa, que aparentemente se encontra em fuga, refere o texto da acusação.

Zenu teria apresentado ao pai-Presidente da República uma carta supostamente pertencente ao banco francês BNP Paribas a solicitar uma audiência a José Eduardo dos Santos para constituir o referido Fundo de Investimento Estratégico através de uma operação de financiamento de 30 biliões de dólares americanos.

José Eduardo dos Santos teria então encarregado o seu e atual ministro das Finanças, Archer Mangueira, de receber esses banqueiros e desenvolver o processo.

Depois de alegadamente agendar um encontro com os banqueiros franceses, o ministro ter-se-ia deslocado a Lisboa, na companhia de Valter Filipe, para a referida audiência.

Contudo, na reunião em Lisboa "não apareceu nenhum banqueiro francês, mas sim Zenu, Jorge Sebastião e Hugo Onderwater", escreve o portal de Rafael Marques, citando o mesmo despacho de acusação do Ministério Público assinado pelo procurador João Coelho.

Archer Mangueira teria então saído da reunião insatisfeito, aconselhando o Presidente Eduardo dos Santos a não assinar qualquer contrato vinculativo do Estado Angolano.

Mas o ministro acabaria afastado das negociações, ficando Valter Filipe que "se apressou a assinar um contrato de consultoria técnico-financeira com a empresa Mais Financial Services, S.A.", em 3 de julho de 2017", a pouco menos de um mês de eleições gerais.

"De imediato, a empresa emite faturas ao BNA, que, sem ter havido qualquer serviço realizado, paga celeremente 25 milhões de euros até 31 de julho de 2017", sublinha o texto, precisando que a transferência foi materialmente executada por António Samalia Bule Manuel, sem respeitar os procedimentos regulamentares.

A transferência "foi uma espécie de pagamento avançado" para o consórcio montar uma operação de financiamento de Angola no valor de 30 biliões de dólares americanos, quando, na verdade "não havia operação financeira nenhuma, nem capacidade por parte dos interlocutores para montar um financiamento de montante tão elevado".

Nos termos da acusação, prossegue o texto, "tudo não passou de um embuste para retirar dinheiro ao Estado".

Todavia, o Governo angolano anunciou, em abril deste ano, ter já recuperado os 500 milhões de dólares americanos "transferidos ilegalmente" para o exterior, em setembro de 2017, confirmando que o dinheiro "já se encontra" na posse do BNA.

Na altura, o Ministério angolano das Finanças esclareceu que as autoridades angolanas estavam empenhadas na recuperação da "totalidade dos valores pagos", no âmbito da estruturação da referida operação financeira fraudulenta.

Trata-se, nomeadamente, da recuperação de mais 24,85 milhões de euros, que também teriam sido indevidamente transferidos para a mesma conta da empresa Mais Financial Services (MFS), em Londres, resultante de "uma prestação de serviços não realizada".

O Governo angolano agradeceu às autoridades britânicas e "a todos aqueles que de alguma forma contribuíram para a recuperação destes recursos públicos, que neste momento difícil muita falta fazem à economia do país".

-0- PANA IZ 20set2018