Agência Panafricana de Notícias

Educação como novo antídoto de conflitos em África

Dakar- Senegal (PANA) -- Embora muito antiga no tempo, a noção de "Educação para a Paz" só agora começa a ganhar corpo em África como um recurso a ter em conta na via do combate à violência.
Ela está presente em vários instrumentos jurídicos internacionais como a própria Carta das Nações Unidas adoptada desde 1945, a Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948) e, finalmente, a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (1989), entre outros.
Isto sem falar das Constituições nacionais do Mundo contemporâneo bem como dos principais manuais religiosos como a Bíblia e o Corão que pregam todos o amor ao próximo e a sacralidade da vida humana.
Há mais de dois mil e 500 anos, Pitágoras, o reitor da primeira Universidade do Mundo, já aconselhava: "Eduquem as crianças de hoje e não será preciso punir os homens de amanhã".
Mas a realidade mostra hoje que a ideia da Educação para a Paz ficou confinada ao papel.
Na prática, pelo contrário, algumas das suas potenciais correias de transmissão como a Universidade e a Religião, viraram uma espécie de incubadoras do vírus do ódio e da tragédia.
Como resultado, o Mundo acabou por criar mais aptidões para fazer a guerra que para fazer a paz, e mais propensão para fomentar o ódio e a injustiça social que para promover a harmonia e a fraternidade.
É a partir desta constatação que, aparentemente, o novo movimento de Educação para a Paz passou a acreditar ser possível fazer-se algo para se inverter o quadro e romper com a tendência actual de apenas apagar incêndios ou sintomas em vez de atacar as causas.
Nesta perspectiva, a cidade turística de Mombasa, no sudeste do Quénia, acolheu recentemente mais uma conferência ministerial sobre o papel da Educação na prevenção e resolução de conflitos.
Organizada pela Associação para o Desenvolvimento da Educação em África (ADEA) em parceria com o Governo queniano, a reunião congregou delegações de países vítimas de conflitos violentos em África para estudar as melhores formas de fazer avançar a Educação para a Paz.
O balanço dos debates decorridos de 14 a 16 de Setembro de 2009 no "Mombasa Continental Resort Hotel" saldou-se numa quase "ratificação" dos ideais defendidos pelos organizadores do evento que torciam para um lugar privilegiado do sector educativo na luta contra a violência em África.
Desde o início, os principais responsáveis da ADEA bateram-se pela reafirmação e reconhecimento efectivo da Educação como um verdadeiro instrumento da cultura da paz para prevenir e resolver conflitos.
"A Educação não deve estar limitada à facilitação da aquisição de conhecimento, informação e habilidades.
Ela deve igualmente visar a transformação das mentes e dos corações", frisava já na abertura do encontro o presidente da ADEA, Dzingai Mutumbuka.
Mais precisamente, Mutumbuka aludia à necessidade da integração nos programas educativos da questão da diversidade cultural de forma a ser reconhecida por todos "como uma riqueza e não um problema" e para que os educandos saibam "aceitar e respeitar a identidade dos outros".
Para confirmar a pertinência e a oportunidade desta abordagem, a Declaração final da reunião de Mombasa acabou por configurar uma reprodução quase que integral da intervenção do responsável da ADEA.
É assim que a inclusão gradual nos programas curriculares de matérias obrigatórias especialmente orientadas para o cultivo da paz, da tolerância e do respeito pela diversidade, desde os níveis primário ao universitário, ficou retida como um dos objectivos a prosseguir.
A intenção é começar a incutir nos alunos, logo desde a sua iniciação escolar, o espírito de rejeição da violência em nome da sacralização da vida humana, do amor próprio, do amor ao próximo e do respeito pela diferença.
Tal como Mutumbuka, o comunicado final do encontro define a Educação como um elemento cultivador da paz que deve ir além da mera transmissão de conhecimentos "para procurar transformar os corações e as mentes e permitir aos seres humanos viver em harmonia".
No mesmo texto, esta harmonia é também condicionada à aceitação pelos discentes da diversidade racial, étnica, religiosa e cultural das suas sociedades como "uma parte importante do seu património nacional".
Para que tal aconteça, o documento também defende a "integração dessa diversidade nos programas educativos, formais e informais, e a incorporação duma dimensão especificamente virada para a erradicação da violência e a promoção da coexistência pacífica entre os povos".
Os Governos africanos são assim chamados a formular e/ou fortalecer políticas e estratégias adequadas e garantir a efectiva implementação, fiscalização e avaliação dos programas de Educação para a Paz.
Ao longo dos debates, os aspectos à procura de consensos pareciam resumir-se essencialmente às modalidades de aplicação prática do projecto com uns a sugerirem o ajuste dos currículos já existentes e outros a introdução de cadeiras completamente separadas e autónomas.
Aparentemente, um dos grandes inspiradores deste novo movimento tem sido o Quénia que se encontra já numa fase bem adiantada e visivelmente apostado em prevenir uma reedição de episódios similares aos da crise pós-eleitoral de 2007 que causou ao país pesados danos.
Logo após esta tragédia, localmente descrita como "a pior crise política desde a independência do país em 1963", o Governo queniano lançou um programa de Educação para a Paz que já permitiu produzir manuais escolares específicos e formar professores especializados.
O programa em curso foi elaborado após consultas com vários intervenientes do sector incluindo as direcções das universidades e das escolas bem como as agências especializadas das Nações Unidas.
Desde o seu lançamento em Fevereiro de 2008, foram já distribuídos em todo o país 50 mil exemplares de material didáctico sobre Educação para a Paz e formados seis mil especialistas vários entre professores e responsáveis escolares, segundo o Ministério queniano da Educação.
Programas similares estão também em curso de implementação ou de elaboração em vários outros países da região e do continente, incluindo o Uganda, a Côte d'Ivoire e Angola tal como revelado pelos seus responsáveis que participaram na conferência de Mombasa.