Agência Panafricana de Notícias

Defesa de Alex Saab recorre da decisão de extradição para Estados Unidos

Praia, Cabo Verde (PANA) - A defesa do empresário colombiano Álex Saab, detido em Cabo Verde desde 12 de junho, já entregou no Supremo Tribunal de Justiça (STJ) o recurso contra a decisão do Tribunal de Relação de Barlavento, na ilha de São Vicente, que determinou a sua extradição para os Estados Unidos, no passado 31 de julho, apurou a PANA na cidade da Praia.

A equipa internacional de defesa Alex Saab chefiada pelo antigo juiz espanhol Baltasar Garzón considera que  se trata de um caos e denuncia o "caráter político” da decisão, pelo que pede às autoridades cabo-verdianas que “reconheçam com urgência esta realidade”.

Para Garzón, “em jogo está a vida e a liberdade de uma pessoa contra a qual, neste momento, nenhuma das acusações feitas pelos Estados Unidos foi provada”.

Conforme a mesma fonte, este recurso, sobre o qual o STJ tem até 80 dias para decidir, faz parte das ações legais que a defesa iniciou após ter ouvido o tribunal da instância inferior, considerado como “não fundamentado e não respondendo às questões suscitadas na oposição”.

Baltasar Garzón explica que se trata de um recurso em que a defesa sublinha “o caráter político do caso” e insta as autoridades cabo-verdianas a reconhecerem esta realidade”.

Para a defesa, destaca-se a importância de avaliar a magnitude do confronto dos Estados Unidos contra a Venezuela e a sua influência no caso de Saab, “porque o que está em jogo aqui é a vida e a liberdade de uma pessoa que está a ser acusada de transgressão com base em provas de testemunhas desacreditadas.”

Garzon acrescenta que “não foi apresentado um único elemento de prova pelos Estados Unidos para fundamentar estas alegações. Os Estados Unidos estão a tentar obter protagonismo e a enlamear em prol do Executivo, em vez do interesse da justiça”.

Segundo o mesmo documento, depois de considerar o recurso, "o STJ pode pronunciar-se de duas formas: reconhecendo os erros do tribunal em primeira instância e remetendo o caso para o Tribunal da Relação de Barlavento ou decidindo sobre a extradição propriamente dita, aceitando-a ou rejeitando-a".

“Se optar pela primeira opção, seria uma questão de corrigir os abusos dos direitos e garantias processuais do nosso cliente”, disse Garzon acrescentando que , “poderíamos enfrentar o procedimento regular de extradição de acordo com a legislação de Cabo Verde”.

Este procedimento, conforme a mesma fonte, exigiria o pleno conhecimento do mandato do Ministério Público, “para que seja possível ter uma audiência mandatada por lei, na qual os argumentos delineados pela defesa e pelo próprio Saab, os pareceres jurídicos dos peritos apresentados e os elementos de prova solicitados possam ser ouvidos. “Por outras palavras, os erros processuais manifestos não seriam desconsiderados e o procedimento recomeçaria, mas desta vez, de forma a que o enviado especial Saab usufrua do devido processo a que tem direito legal”.

A outra opção seria que o STJ tomasse uma decisão direta sobre o mérito do pedido de extradição. “Caso o Tribunal se pronuncie a favor da concessão do pedido de extradição, a defesa do Saab declarou que exercerá todos os direitos e utilizará todos os mecanismos nacionais e internacionais para que essa extradição não se efetue”.

A equipa pretende colocar ênfase na imunidade do enviado especial, na ilegalidade da sua detenção, na violação das próprias regras da Interpol ao permitir a detenção de Saab através dos seus canais, nas violações dos seus direitos humanos básicos e fundamentais, o caráter político e extraterritorial do pedido de extradição propriamente dito.

“E, por último, mas não menos importante, demonstrando de forma irrefutável que as alegações que estão no cerne da acusação de Miami e, por conseguinte, o pedido de extradição são infundadas, sem mérito e criadas para cumprir a vontade do Executivo, em vez de qualquer processo significativo de aplicação da lei”.

Entretanto, o gabinete do advogado espanhol, Ilocad, contratado pela equipa de defesa do empresário, revelou em comunicado que as autoridades cabo-verdianas não permitiram a entrada no país de um dos seus advogados e criticou o postura dos Estados Unidos.

A nota diz que na quinta-feira, 13, e na sexta-feira, 15, um advogado da Ilocad foi impedido de entrar por “não ter podido fundamentar o motivo da viagem”.

Depois de ter regressado a Lisboa (Portugal) no primeiro dia e seguido de novo para Cabo Verde, a equipa de Garzón aponta o dedo às autoridades do arquipélago.

“Apesar de demostrar as razões legítimas e a necessidade objetiva de entrar em Cabo Verde, e de cumprir plenamente as provas de teste da covid-19, de apresentar as cartas de convite, o propósito da viagem, a disponibilidade para pagar as taxas do aeroporto como normalmente e como reconheceu a propria companhia aérea, fui impedido de entrar por motivo aleatório”, escreve o advogado que se deslocou a Cabo Verde, sem indicar o nome.

O antigo juiz Baltasar Garzón, considerou “intolerável” a situação e acusou Cabo Verde de prejudicar gravemente o exercício da defesa de Alex Saab.

“Esta é mais uma prova das limitações que estão a ser impostas. É óbvio que estão a ser colocados obstáculos no caminho do nosso cliente, Alex Saab, para aceder ao seu direito de defesa”, lê-se na nota.

Com o recurso da defesa entregue ao STJ, aguarda-se agora a decisão do órgão máximo da justiça cabo-verdiana neste caso que tem atraído a atenção mundial.

O próprio Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca, num raro pronunciamento quando questionado por jornalistas, a 2 de julho, revelou ter recebido muitas chamadas de chefes de Estado de vários países mas que o assunto era essencialmente da esfera judicial.

“Tanto é assim que não me lembro de receber tantos telefonemas, chamadas de chefes de Estado estrangeiros”, disse Jorge Carlos Fonseca sem dar mais detalhes, acrescentando, no entanto, estar seguro que o caso“será conduzido de acordo com as regras próprias de um Estado de Direito democrático”.

Álex Saab foi detido a 12 de junho em Cabo Verde, quando estava a caminho do Irão, onde, segundo o Governo da Venezuela, iria negociar a compra de produtos e bens para o país.

Ele foi detido a pedido dos Estados Unidos que o acusam de vários crimes, como lavagem de mais de 350 milhões de dólares nos bancos americanos.

-0- PANA CS/IZ 17ago2020