Agência Panafricana de Notícias

Crise cíclica de energia um cancro em São Tomé e Príncipe

São Tomé, São Tomé e Príncipe (PANA) - São Tomé e Príncipe observa, há já dois meses, uma crise energética provocada pela manutenção dos 12 geradores instalados nas suas quatro centrais térmicas, deixando o país parcialmente às escuras.

Na quarta-feira última, a população saiu às ruas em protesto, porquanto a solução « para breve » prometida pelo Governo tarda a chegar.

Com buzinão de motorizadas e viaturas, um grupo autointitulado de « membros da sociedade civil »percorreu algumas artérias da capital, São Tomé, onde o fornecimento da energia deixou de ser regular, em finais de abril passado.

“Ninguém faz nada, não se pode aceitar. Todos os anos, o país faz investimentos no setor energético, compra geradores mas assiste-se à falha recorrente de energia”, desabafou um dos manifestantes.

Estes últimos deploram ainda o facto de que, não obstante o baixo consumo da energia, no período da crise, « os preços continuam a ser os mesmos » nas faturas da Empresa de Água e Eletricidade (EMAE).

“Famílias humildes precisam de energia para fazer os seus negócios, há quem viva de iogurte, gelado entre outras. E nós cumprimos sempre os nossos deveres”, corroborou outro manifestante.

Recentemente, um jovem artista e figura de proa da cultura são-tomense dirigiu fortes críticas ao Governo do primeiro-ministro  Jorge Bom Jesus, na rede social Facebook, pela forma como este tem lidado com o processo.

“O povo não precisa de porto em águas profundas. Os nossos filhos, que representam o desenvolvimento, precisam sim de energia. Os comerciantes precisam de energia para conservar peixe ou produtos para venderem no dia seguinte”,  avançou.

Inconformado, disse ainda que não pertence ao partido no poder nem tão-pouco está contra os dirigentes do Estado, mas que se trata de uma manifestação de descontentamento e revolta.

O artista disse ter perdido eletrodomésticos devido à  instabilidade energética, e que não entende como, em 45 anos de Independência, o país ainda não conseguiu resolver um dos problemas básicos da população.

Devido à onda de contestação ao Governo de Jorge Bom Jesus, o primeiro-ministro são-tomense, que, durante a campanha para as eleições legislativas de outubro de 2019, prometeu mais energia e água à população, assumiu que  a situação da energia « fugiu » do seu controlo.

“Eu quero pedir serenidade à população. A energia vai melhorando, é um problema estrutural, que nós temos desde 1975”, tranquilizou.

O primeiro-ministro são-tomense, que visitou as quatro centrais térmicas do arquipélago para se inteirar do problema, considera agora que o país deve migrar para o sistema de energia renovável, tendo em conta as complexidades da energia térmica.

“Carregamos este fardo da energia térmica, é preciso catapultar para outros níveis de libertação da autonomia. Eu quero sobretudo pedir à população muita calma e que não se deixem aliciar por aventureiros”, continuou.

Anunciou conversações em curso entre Governo e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), para a instalação de uma rede de painéis solares, na Central de Santo Amaro, um projeto piloto que visa a transição da energia fóssil para a renovável.

“Existem fatores externos, que não me permitem dizer o horizonte temporário quando todos os grupos irão funcionar. No entanto, as aquisições já foram feitas. As peças vão chegando, vamos trabalhando no sentido de repor o funcionamento da central”, afirmou um técnico da EMAE, durante a visita do primeiro-ministro à Central de Santo Amaro.

O especialista disse haver situações que aparecem durante a manutenção, mas que   gradualmente vai melhorar-se o fornecimento de energia.

Para além de tais situações, o primeiro-ministro disse haver também « fatores que não controlamos”, referindo-se à  pandemia da covid-19, que, segundo ele, está diretamente por detrás da chegada tardia dos grupos geradores que se encontram em manutenção.

Explicou que a falha na entrega das peças prejudicou a produção energética, no país, devido ao encerramento das empresas e à paralisação de navios e de muitos aviões cargueiros, o que agudizou a crise energética, em São Tomé e Príncipe.

A crise, que se tronou numa espécie de cancro, no arquipélago, é um problema que ganha maior relevância sobretudo no período eleitoral e contribuiu, nalguns casos, para a vitória da oposição e derrota de partidos no poder.

Assim aconteceu com o Governo de Patrice Trovoada, quando, na reta final do seu mandato, a crise energética se tornou insustentável, com  manifestações violentas e barricadas, em diversos bairros, culminando com a derrota eleitoral pela impopularidade das medidas implementadas na altura.

E agora, com o nível de descontentamento a aumentar no seio da população e praticamente na contagem decrescente para as eleições presidenciais de 18 de julho próximo, o Governo sustentado pelo MLSTP/PSD multiplica esforços para garantir o fornecimento regular de energia, até junho, para que o seu candidato de “cabelos brancos que soube esperar a sua vez” não seja sancionado nas urnas.

Por Ramusel Graça

Correspondente da Panapress

-0- PANA RMG/IZ 22maio2021