Agência Panafricana de Notícias

Armadores boicotam mercado de transporte interilhas em Cabo Verde

Praia, Cabo Verde (PANA) - Os armadores cabo-verdianos, filiados na respetiva associação (ACAMM), “não vão participar” na quota de mercado de 25 porcento que lhes foi atribuída na sequência do concurso público para a concessão do transporte interilhas, ganha pela empresa portuguesa Transinsular, apurou a PANA, quarta-feira, na cidade da Praia.

Em declarações à imprensa, na cidade do Mindelo, na ilha de São Vicente, o presidente da ACAMM (Associação Cabo-verdiana dos Armadores da Marinha Mercante), João Guilherme, justificou a decisão com o facto de se tratar de um “alto investimento sem retorno”.

João Guilherme argumentou que quem domina 75 porcento do mercado vai encontrar formas de “contornar os resultados finais”.

Estando fora deste processo, acrescentou, os armadores nacionais “não sobreviverão”, uma vez que, para além dos ativos, estão em causa ainda “mais de uma centena de funcionários” e os encargos bancários das companhias cabo-verdianas.

Revelou que a ACAMM está a dar “passos” nesse processo e que não exclui o recurso “à via judicial”.

“Mas estamos cientes de que o Governo vai consciencializar-se e mudar de opinião em relação ao que se esta a passar e voltar para os armadores nacionais e encontrar uma saída para o país”, precisou.

Segundo o armador, a ACAMM tem estado a desempenhar o seu papel no sentido de convencer o Governo de que esta não é a melhor via para os transportes marítimos no arquipélago e que deveria trabalhar com os nacionais para se encontrar a melhor solução para a resolução do problema.

No entanto, ele reconheceu que a Marinha mercante cabo-verdiana “não está nas melhores condições”, mas que “a culpa não é apenas dos armadores, mas também do Governo”.

Por exemplo, precisou, o preço dos fretes tem-se mantido desde 2006, e os encargos para o Estado, principalmente as taxas da empresa pública de administração dos portos (Enapor), “aumentaram consideravelmente”.

Para o presidente da ACAMM, em primeiro lugar está o país, tendo em conta que uma empresa estrangeira virá à procura de lucro e, se tal não ocorrer, “vai-se embora”, concluiu.

Por sua vez, a presidente do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV), principal partido da oposição, que se reuniu, terça-feira, no Mindelo, com a direção da ACAMM, disse que encontrou a classe dos armadores marítimos “desalentada” por ter sido “excluída” do concurso de concessão das linhas interilhas.

Janira Hopffer Almada acusou o Governo de excluir “de forma ostensiva” os armadores nacionais da concessão das linhas entre as ilhas, entretanto já atribuída a uma empresa estrangeira.

“Neste momento, temos um concurso intransparente, objeto de várias suspeições, com notícias a darem conta de um grande ziguezague, tudo na perspetiva clara e evidente de exclusão dos armadores nacionais”, ajuntou a líder da oposição, que questionou também o primeiro-ministro e o Governo sobre o que está por detrás desta “tentativa de liquidar” os armadores nacionais.

É que, prosseguiu, este é um país-ilhas com “problemas nos transportes aéreos” e, se os tiver na área marítima, o país “não garante a coesão territorial e nem a mobilidade dos Cabo-verdianos”.

“Para além das centenas de postos de trabalho e dos compromissos bancários, há a questão da coesão territorial e se essa empresa estrangeira vier, se o negócio não correr bem, se as linhas não forem rentáveis e decidirem ir-se embora, o que faremos?”, questionou Janira Almada.

Pediu ao Governo, em nome dos interesses nacionais, que faça um concurso “sério e transparente, e que envolva e integre os armadores nacionais na solução e, sobretudo, garanta que o setor não fique refém de interesses outros como nos transportes aéreos”.

Segundo ela, a solução dos 25 porcento da quota do mercado destinada aos armadores nacionais “não é razoável, nem aceitável e nem realista”, uma vez que se trata de pelo menos 14 companhias marítimas, ou seja, cada uma “nem vai ficar com dois porcento” do mercado.

A líder da oposição acusou também o Governo de dizer “apenas parte da verdade”, já que “não diz que essas companhias devem entrar com um milhão de euros”, o que “não é realista para o país”, mas sim “uma forma de excluir os armadores nacionais sob a capa de concursos intransparentes”.

-0- PANA CS/IZ 08nov2018