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Angola protesta contra posição da UE sobre prisão de jovens ativistas

Luanda, Angola (PANA) - O Governo angolano convocou quinta-feira o embaixador da União Europeia (UE) no país, Gordon Kricke, para pedir explicações sobre a recente declaração contra a condenação a prisão efetiva, em primeira instância, dos 17 jovens ativistas angolanos que vinham sendo julgados desde novembro passado por “atos preparatórios de rebelião”.

No documento que as autoridades angolanas classificaram de atitude “inamistosa”, os diplomatas europeus, designadamente, delegação da UE e as embaixadas dos Estados-membros e da Noruega, afirmavam esperar que os anunciados recursos da condenação dos 17 ativistas, a penas de dois a oitos anos de cadeia, permitam respeitar os direitos destes jovens.

Falando no fim do encontro com o embaixador Kricke, o secretário de Estado angolano das Relações Exteriores, Manuel Augusto, disse não ser normal o procedimento seguido pelos diplomatas europeus, porque “o Ministério das Relações Exteriores não foi previamente contactado pela delegação da UE sobre a divulgação dessa declaração”.

“Manifestamos profundo descontentamento com uma atitude que consideramos no mínimo inamistosa”, disse o secretário de Estado angolano, admitindo ainda “grande preocupação por este tipo de atuação”.

Segundo ele, a tal declaração traduz-se também numa clara ingerência nos assuntos internos de um Estado soberano, “para além de representar uma clara violação das normas de relacionamento internacional, nomeadamente da Convenção de Viena sobre as relações diplomáticas e consulares”.

“Dissemos ao senhor embaixador que tal atitude é inaceitável e que esperamos muito sinceramente que ela não se venha a repetir”, disse o secretário de Estado, notando que “a declaração da UE vai ao ponto de qualificar as decisões do Tribunal angolano, indo ao ponto de referir a proporcionalidade ou razoabilidade da sentença ditada pelo tribunal”.

No final da reunião de cerca de 30 minutos, na sede do Ministério das Relações Exteriores, em Luanda, o embaixador Gordon Kricke não quis prestar declarações aos jornalistas.

No seu documento conjunto, os representantes diplomáticos europeus acreditados em Luanda recordavam que o caso dos ativistas e as penas divulgadas na segunda-feira pelo Tribunal Provincial de Luanda “tem vindo a suscitar reservas no que concerne ao respeito pelas garantias processuais e pelo princípio da proporcionalidade”.

“A UE espera que os mecanismos legais de recurso disponíveis ofereçam aquelas garantias, em conformidade com os direitos e os princípios consagrados na Constituição angolana”, lê-se na declaração, recordando que os observadores europeus não tiveram acesso ao julgamento, que decorreu entre 16 de novembro e 28 de março deste ano.

Contudo, Manuel Augusto afastou, para já, consequências deste caso nas relações entre Angola e a União Europeia, mas afirmou que os Angolanos “não abdicam da soberania”, do “orgulho” na independência e de serem “tratados como iguais”.

“Não podemos aceitar que nos passem um atestado de menoridade porque este é um país que já não vive sob tutela e que não tem nenhum patrão”, avisou Manuel Augusto, acrescentando que o diplomata europeu justificou a tomada de posição sobre a condenação dos ativistas com “instruções das capitais” dos países representados em Luanda.

Depois de abandonar, por falta de provas, a acusação inicial de crime de atentado contra o Presidente da República e outros órgãos de soberania, o Tribunal Provincial de Luanda decidiu punir os 17 ativistas pelos crimes de "atos preparatórios de rebelião e associação de malfeitores".

O reú Domingos da Cruz, tido como o líder do autodenominado grupo "Movimento Revolucionário", obteve a pena mais alta, com oito anos e seis meses de prisão efetiva.

Na leitura da sentença, o juiz da causa, Januário José Domingos, insistiu contudo que os réus "formaram uma associação de malfeitores para destituir o Presidente da República e os titulares dos órgãos de soberania e substitui-los por pessoas de sua confiança".

"Pretendiam ainda elaborar outra Constituição e formar um governo dito de Salvação Nacional", argumentou, afirmando que o estudo, pelos réus, de estratégias para executar o seu plano "acobertado no curso de ativismo" sobre ferramentas para destruir o ditador e evitar nova ditadura” e a conceção de uma lista nominal dos membros do projetado Governo de Salvação Nacional, "são elementos típicos constitutivos do crime de atos preparatórios".

No seu entender, constituíram agravantes o facto de o crime ter sido "premeditado" e cometido por várias pessoas".

Assim, o Tribunal condenou ainda Sedrick de Carvalho, José Gomes Hata, Fernando António Tomás “Nicolas”, Nelson Dibango, Albano Evaristo Bingo Bingo, Arante Kivuvo, Inocêncio de Brito, Laurinda Gouveia, Hitler Tchikonde, Afonso Matias, Nuno Dala e Manuel Chivonde Nito Alves, a penas de quatro anos e seis meses cada.

Por seu turno, o réu Luaty Beirão foi condenado a cinco anos e seis meses de prisão efetiva, enquanto que, por terem beneficiado de atenuantes como réus primários e com pouca participação nos atos, os co-réus Benedito Jeremias Dali “Dito” e Rosa Kusse Conde receberam as penas de dois anos e três meses de prisão efetiva.

A defesa apresentou recurso para o Tribunal Supremo por discordar das condenações e pediu o efeito suspensivo das mesmas. O juiz da causa aceitou o recurso mas indeferiu a suspensão do efeito das penas, mantendo os presos na cadeia "por terem merecido pena maior".

Os condenados deverão ainda pagar 50 mil kwanzas angolanos, cada um, de taxa de Justiça (um dólar americano equivale a cerca de 160 kwanzas angolanos).

-0- PANA IZ 01abril2016