Agência Panafricana de Notícias

Angola considera ofensiva recusa de Portugal de transferir caso Manuel Vicente

Luanda, Angola (PANA) - O novo Presidente angolano, João Lourenço, considerou "ofensiva" a recusa de Portugal de transferir para a justiça angolana o processo-crime aberto, em Lisboa, pelo Ministério Público luso contra o antigo Vice-Presidente de Angola, Manuel Vicente.

No seu primeiro pronunciamento público sobre o assunto, João Lourenço acusou Portugal de "descredibilizar" as instituições judiciárias angolanas, ao rejeitar o pedido de transferência do processo em causa, alegando "falta de confiança" no sistema judicial angolano.

O chefe de Estado angolano falava esta segunda-feira, no Palácio Presidencial, em Luanda, na sua primeira entrevista coletiva que coincidiu com os seus primeiros 100 dias de governação, desde a sua chegada ao poder na sequência das eleições gerais de 23 de agosto passado.

Ele declarou a sua firme pretensão de ver a questão ser resolvida em Angola, argumentando que o seu Governo não está a pedir "a absolvição de Manuel Vicente, mas apenas que (este) seja julgado no seu país".

Perguntado sobre a medida a tomar por Angola caso Portugal confirme a sua rejeição, João Lourenço não avançou pormenores, mas condicionou "o retorno normal" das relações entre os dois Estados à transferência do processo de Manuel Vicente para a Justiça angolana.

Segundo João Lourenço, as relações com Portugal vão "depender muito" da resolução do caso Manuel Vicente cujo tratamento atual pela Justiça portuguesa é "uma ofensa" para Angola.

“A bola está do lado de Portugal”, frisou o chefe de Estado angolano, que respondia a questões colocadas pelos jornalistas presentes na conferência de imprensa sobre diversos domínios da vida política, económica e social do país.

O pedido de Angola para a remessa do processo de Manuel Vicente foi assumido publicamente, pela primeira vez, em finais do ano passado, pelo ministro angolano das Relações Exteriores, Manuel Domingos Augusto, que citou os termos de um acordo judiciário bilateral.

Na altura, Manuel Augusto disse que a alegação de "falta de confiança" do Ministério Público português na Justiça angolana constitui apenas um "juízo de valor que não pode existir".

Portugal "não tem direito de pôr em causa o nosso sistema judiciário", sentenciou o chefe da diplomacia angolana, quando falava a jornalistas em Abidjan, capital económica ivioirense, onde participou na quinta cimeira África-Europa, realizada de 29 a 30 de novembro de 2017.

Ele esclareceu que não se trata de "birra ou complexo" na medida em que está em causa a soberania do país, reafirmando ao mesmo tempo que as relações diplomáticas e políticas com o país europeu "são excelentes, e as económicas necessárias".

Para Manuel Augusto, o caso que envolve Manuel Vicente não é tratado pela Justiça portuguesa como um mero caso de Justiça. "É tratado como um caso político", insistiu.

“Se os factos que lhe são imputados tiveram lugar quando ainda não era Vice-Presidente da República, por que razão ganharam força quando ele estava nesta condição?”, questionou.

Manuel Vicente, antigo Vice-Presidente angolano, é acusado de corromper o procurador português Orlando Figueira para arquivar inquéritos em que eram visados ele e outras personalidades angolanas por crimes de corrupção, falsificação e branqueamento de capitais.

O processo ficou conhecido como "Operação Fizz", em que a Manuel Vicente em particular são imputados factos que ele teria praticado ainda no seu tempo de presidente do Conselho de Administração da petrolífera angolana, Sonangol.

Nos termos do Acordo de Cooperação Jurídica e Judiciária vigente entre os dois países, cada um dos Estados pode pedir o início ou continuação de procedimento penal "contra uma pessoa que se encontre no seu território e que tenha cometido uma infração no território do outro".

O mesmo acordo, assinado em 30 de agosto de 1995, não admite a extradição quando, entre outros casos, a pessoa reclamada seja nacional do país requerido, coincidindo assim com a Constituição angolana que proíbe, no seu artigo 70º, a extradição de cidadãos nacionais.

-0- PANA IZ 08jan2017