Agência Panafricana de Notícias

Oposição angolana lamenta adoção de 23 de março como dia da África Austral

Luanda, Angola (PANA) - O principal partido da oposição em Angola, UNITA, deplorou a recente decisão dos líderes da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) de adotar o 23 de março como "Dia da Libertação da África Austral".

A decisão foi tomada a 18 de agosto corrente, na capital namibiana, Windhoek, durante a 38ª cimeira ordinária dos chefes de Estado e de Governo da SADC.

Num comunicado divulgado esta terça-feira, o partido liderado por Isaías Samakuva diz que "lamenta profundamente o facto de que os chefes de Estado e de Governo da SADC se tenham deixado manipular pelo Executivo angolano, movido há muito por interesses não confessados".

No entender da UNITA (União Nacional para a Independência Total de Angola), o dia 23 de março de 1988 marcou o fim de uma batalha militar, "que não representou o fim da guerra em Angola nem significou a libertação da África Austral".

Trata-se, segundo a nota, da Batalha do Cuito Cuanavale, que decorreu de 1987 a 1988, numa altura em que "Angola, Zâmbia, Botswana, Moçambique, Malawi, Tanzânia, a Swazilândia, Zimbabwe e a própria África do Sul já eram independentes".

Por isso, refere o documento, "é uma mentira grosseira atribuir a libertação da África Austral à Batalha do Cuito Cuanavale que apenas existiu devido ao fracasso da tentativa de tomada da Jamba", antigo quartel-general da UNITA enquanto movimento rebelde.

"A UNITA saúda a libertação de toda a África e não apenas da África Austral (...) um processo político-cultural ainda em curso, que envolverá, sem falta, o fim dos regimes neocoloniais, o fim dos regimes autoritários e de todos aqueles que, afirmando-se democráticos, são dominados por um Partido-Estado ou por uma oligarquia", sublinha.

O documento acrescenta que a libertação da África Austral "não se limita a feitos militares enquadrados no contexto da guerra fria e completamente deturpados da realidade", mas que exige "muito mais do que os desfechos de batalhas militares, cujos custos reais ainda hoje estão a ser pagos, quer através de dívidas viciosas, quer através da delapidação de recursos minerais ou da fuga de capitais, que os povos simplesmente não controlam".

A decisão em causa foi aprovada por unanimidade dos 16 Estados-membros da SADC durante a 38ª cimeira da organização regional, ocasião aproveitada pelo chefe de Estado angolano, João Lourenço, para agradecer aos seus homólogos presentes no encontro por esta convergência demonstrada na adoção do documento proposto por Angola.

Com a consagração do 23 de março como Dia da Libertação da África Austral, a efeméride passa a ser feriado nacional em todos os países-membros da SADC.

A Batalha do Cuito Cuanavale foi travada na província meridional angolana do Cuando Cubango, de novembro de 1987 a março de 1988, envolvendo as então Forças Armadas Populares de Libertação de Angola (FAPLA) contra o Exército do antigo regime segregacionista da África do Sul ao lado da UNITA, então movimento rebelde liderado por Jonas Savimbi.

A batalha é descrita como o maior confronto militar da guerra civil angolana, em que as FAPLA combateram com o apoio de forças cubanas contra a UNITA e o Exército sul-africano.

É também considerada a batalha mais prolongada que teve lugar no continente africano desde a segunda Guerra Mundial.

A África do Sul, que fazia fronteira com Angola por meio do território da atual Namíbia, estava determinada a impedir que as FAPLA ganhassem o controlo da região e permitissem que a Organização do Povo do Sudoeste Africano (SWAPO), enquanto movimento de libertação, atuasse livremente para obter a independência da Namíbia, então sob ocupação sul-africana.

Ambos os lados do conflito reivindicaram vitória, e até hoje as narrativas e memórias sobre a batalha são objeto de debate.

Não obstante, o evento tornou-se no ponto de viragem decisivo na guerra que se arrastava havia longos anos, incentivando um acordo entre a África do Sul e Cuba para a retirada das suas tropas do território de Angola e a assinatura dos Acordos de Nova Iorque.

Estes entendimentos nova-iorquinos permitiram a implementação imediata da resolução 435/78 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que conduziu à independência da Namíbia e ao fim do regime de segregação racial (apartheid), que vigorava na África do Sul.

Na visão de Nelson Mandela, antigo estadista sul-africano, Cuito Cuanavale "foi a viragem para a luta de libertação do meu continente e do meu povo do flagelo do apartheid".

-0- PANA IZ 22agosto2018