Agência Panafricana de Notícias

"Sociabilidade sem fronteiras" marca filosófica de jornalista Alcino da Costa

Dakar, Senegal (PANA) – Numa altura em que a cidade de Dakar se prepara, com grande emoção, para acolher os restos mortais do jornalista senegalês de origem cabo-verdiana Luís Alcino da Costa, cujo enterro terá lugar quarta-feira no cemitério Saint Lazare de Béthanie na capital senegalesa, a PANA recolheu, junto dos companheiros do falecido, a descrição das grandes caraterísticas daquele ao qual todos os testemunhos reconhecem em uníssono um homem dedicado ao desenvolvimento da imprensa africana.

Diomansi Bomboté, jornalista maliano, ex-funcionário da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) e um dos companheiros mais assíduos do falecido, evoca « uma sociabilidade sem fronteiras » que, segundo ele, parece «exprimir mais a personalidade e a filosofia de vida daquele que chama carinhosamente « Grand Al ».

« Ele fez da abertura aos outros a sua principal doutrina, a sua razão de viver. Em Abidjan (Côte d'Ivoire), Ouagadougou (Burkina Faso), Bamako (Mali), Windhoek (Namíbia), Kigali (Rwanda), Kinshasa (Republica Democrática do Congo), Libreville (Gabão), Brazzaville (Congo), Bangui (República Centroafricana), em todos os lugares em África, sentia-se como na própria casa. A sua espontaneidade traduzia a sua preocupação constante de criar, em seu redor, uma certa segurança afetiva universalmente reconhecida», observa.

« Mais trocista do que ele, é impossível ! No primeiro contacto, o novo fica desorientado por uma rudeza destabilizadora. «Anda cá e não se arma de esperto. Quem pensas que és ? ». Mesma consideração quer para os grandes deste mundo quer par os modestos cidadãos . E de repente, a sua grande mão pousa pousa no seu ombro com um surpeendente carinho infinito. Quando te apresenta à assistência só te dá a vontade de te esconder mais longe possível, devido aos elogios», relata Bombote que reconhece que Alcinou lhe inspirou a sua própria conceção da vida: « ser sério, sem se considerar como tal», precisando que « os seres mais reservados, mais introvertidos descongelam-se com neve em contacto com sol».

Desta sede dos outros, o jornalista maliano enumera outras caraterísticas da sua pessoa : « Em primeiro lugar, a generosidade. Sempre propensos a preocupar-se com casos mais desesperantes. Resmunga, zanga-se mas impreterivelmente está presente ! Nâo apenas materialmente, mas sobretudo moralmente. Para tirar uma dúvida e reforçar o moral, pode-se contar com ele. Para defender os casos sociais ou profissionais, a sua tenacidade ultrapassa todas as resistências. Como medianeiro da UNESCO, após a sua reforma, era advogado preferido dos funcionários em situação delicada », prossegue.

Segundo o seu companheiro, « é a mesma generosidade que o carateriza nas trocas políticas ou até de caráter inteletual entre amigos. Desconfiava dos políticos que exploravam os instintos primários dos seus militantes. Receava qualquer posição extremista, qualquer afirmação dogmática, que, segundo ele, só podem levar ao despotismo. Os detentores de verdades imuáveis tiveram, muitas vezes, de recuar diante da sua resistência fria e tenaz questionando os seus julgamentos à luz da sua perspicácia ».

« De uma grande capacidade de escuta, ele estava longe de ser o funil através do qual os ideólogos de todos os tipos pretendiam despejar as suas certezas eternas", revela Diomansi Bomboté, afirmando que « era sempre animado por esta dúvida cartesiana que é, no fundo, a marca dos verdadeiros inteletuais, não com diplomas mas com a confiança em si e com uma atitude serena, de abertura de espírito animado de tolerância baseada na tolerância, na expressão da piedade mal expressa ou de uma superioridade arrogante, mas natolerância-justiça que reconhece o direito à expressão aos espíritos mais iconoclásticos ou mais finórios».

Admite que « Al era a incarnação desta tolerância que é o símbolo da grandeza de alma. Era curioso sobre tudo e estava a parte das novidades tecnológicas mais recentes, o seu espírito estava em ebulição permanente ».

Para este jornalista maliano, « Falar da generosidade de Al, é também evocar o seu senso de humildade. Mas a humilidade para ele não significava indiferença ou falta de personalidade diante do que se considera irracional ou como uma besteira absoluta. Sabia mostrar-se intransigente. Mas a contestação tem limites com ele. Nos seus momentos de ira, resmunga, entra em transes, os narizes se dilatam, a testa ruga-se, a voz fica virulenta, o lábio inferior em batalha se desdobra como para engolir uma presa. Em seguida, uma raspadela da garganta dissipava tudo. O temperamento conciliante dominava a vingança».

Igualmente ex-funcionário da UNESCO, Diomansi Bomboté fala da generosidade que, com Al, « se ia de mãos dadas com a franqueza. Todos os que trabalharam com ele, na Agência de Notícias Senegalesa (APS) , no jornal Le Soleil, na UNESCO e mais tarde no enquadramento da formação de jovens jornalistas, serão unânimes em reconhecer que a complacência não era o género do homem. O seu senso absoluto da organização metódica dificilmente se conciliava com as fantasias do «artista » que era nos seus olhos. O rigor e a precisão eram como uma religião. Podia mostrar-se maníaco e intransigente. A leviandade e as aproximações eram combatiudas de modo feroz. Na escrita, era preciso ser sólido para não sucumbir às suas zombarias, quando achava torto um estilo, a expressão torturada e duvidosa ou a pontuação imprópria. Os Anglófonos afirmam « The devil is in the detail (o diábo encontra-se nos detalhes) ». Com Al, o « diábo » não tinha sossego ! ».

« Eis esta parte de muito dentre nós que se foi embora», concluiu Diomansi Bomboté, para quem « este antigo fundista dos 100 metros, este defesa (futebol) tenaz do Jeanne D’arc de Dakar, este dirigente de movimentos de juventude senegalês e panafricano, este militante católico intransigente ao mesmo tempo universal e amigo de diversos chefes religiosos muçulmanos, se foi embora, deixando órfãos sua filha Nani e os seus irmãos, mas também toda a imprensa africana a que dedicou a sua vida, com o apoio constante da Agência Internacional Francófona (AIF). Apenas falta esperar que a dedicação do padrinho à causa da imprensa africana não seja vã e possa inspirar as gerações futuras ».

-0- PANA SSB/SOC/CJB/DD 06set2011